A hiena bouki e os passaros

Suluu niŋ saŋ la taa kulliwoolto

​Um dia Bouki, a hiena, quis ir à caça com os pássaros chamados Sënar. Eles perguntaram-lhe:

— Mas como vais fazer? Quando caçamos escondemo-nos na folhagem das palmeiras e tu não tens penas para voar.

A hiena pediu-lhes que lhe dessem algumas penas, para que conseguisse ir com eles. Eles deram-lhas mas disseram:

— Ouve, há rolas que dizem: “Acordem, acordem, acordem!” Todas as manhãs anunciam a hora de acordar. Acima de tudo não se deve comê-las.

A hiena concordou.

Voaram e poisaram na palmeira. Mas Bouki não resistiu à imensa vontade de comer rolas. À noite começou a comê-las uma a uma e acabou por as devorar todas. No dia seguinte de manhã não havia ninguém que os acordasse. Um dos pássaros despertou muito depois do que era normal e acordou os outros, a gritar.

— Essa que veio connosco comeu as rolas todas. Que vamos fazer a esta hóspede, que não cumpriu a palavra?

— Tiramos-lhe as penas todas que lhe emprestámos –, responderam os outros.

Puseram mãos à obra e tiraram as penas todas à hiena. Tendo-a assim castigado, os pássaros levantaram voo e deixaram-na sozinha na palmeira. Agora Bouki não conseguia descer da árvore. Um hipopótamo que vinha do mar passou por ali. Levantou a cabeça e vendo Bouki perguntou-lhe:

— Ei, tu aí!, o que fazes aí em cima?

— Foram os pássaros que me abandonaram aqui –, respondeu Bouki –, tiraram-me as penas todas! Como hei-de descer desta maldita palmeira?

O hipopótamo sugeriu-lhe que se deixasse cair e ofereceu-lhe as costas para amortecer a queda. Bouki não hesitou um segundo, fechou os olhos, tomou balanço e ongayar !, atirou-se do cimo da árvore e aterrou com toda a força em cima do hipopótamo. Rebolaram os dois até ao mar e acabaram na água. Bouki estava aterrada, pois não sabia nadar.

O hipopótamo ainda lhe disse:

— Não tenhas medo! Toda esta superfície me pertence, a água é o meu reino. Só peço que te vás para a parte de trás das minhas costas, para que te transporte melhor. Ajeita-te!

Bouki olhou para as costas do hipopótamo e disse:

Tenho medo deste furúnculo que tens nas costas, não consigo aguentar-me em cima dele.

O hipopótamo respondeu:

— Não é um furúnculo, é uma bossa de gordura, não é um furúnculo.

Bouki chegou-se um bocadinho mais para trás nas costas do hipopótamo e começou a pensar:

— Antes de chegarmos vou provar esta bossa cheia de gordura.

O hipopótamo ouviu isto e perguntou:

— O que é que estás a dizer, Bouki?

— Nada, quero apenas agradecer-te por me ajudares a atravessar este mar –, respondeu Bouki.

A alguns metros da margem Bouki mordeu a bossa com muita força e saltou logo para lá.

— Ai, ó! –, gritou o hipopótamo. – Na água os peixes vão morder-me a ferida e na margem as moscas vão fazer o mesmo.

Apesar das dores, o hipopótamo chegou à margem. Pessoas que passavam por ali viram-no estendido e pensaram que estava morto. O hipopótamo contou-lhes a sua desdita e elas decidiram vingá-lo. Começaram a falar em voz alta.

— Há um hipopótamo morto à beira-mar. O que lhe terá acontecido?

— Não se sabe, mas temos de nos organizar para o esquartejar.

— Quando um hipopótamo morre na margem não se pode esquartejá-lo lá, é preciso despejar-lhe água em cima, muita água. Como havemos de fazer?

Temos de apanhar quem o matou e amarrá-lo ao hipopótamo.

Bouki apareceu e gritou:

— Fui eu que o mordi.

Decidiram então atar Bouki e o hipopótamo um ao outro. Quando começaram a atar as cordas, o hipopótamo inspirou profundamente e Bouki disse:

— Ele está a mexer-se, ele está a mexer-se!

As pessoas responderam:

— Não, não, é assim que faz quando o matam, é normal, podemos ter a impressão de que se mexe, mas não.

E continuaram a amarrar Bouki.

— Bem vos disse que ele estava a mexer-se –, disse Bouki.

Mas as pessoas respondiam-lhe sempre a mesma coisa.

Quando acabaram de os atar, hop, o hipopótamo levantou-se, yoyët !, e atirou-se, boxuŋ ! Ficou debaixo de água durante muito tempo e depois emergiu.

— Olha que ainda estou contigo –, disse Bouki.

— Muito bem –, disse o hipopótamo. E mergulhou outra vez, ficando debaixo de água o mesmo tempo.

Depois voltou à superfície.

— Ainda estou contigo –, disse Bouki.

Ele mergulhou pela terceira vez, bem até ao fundo. Desta vez Bouki morreu.